:: Quarto 5 ::

Quando acordei, fiquei um pouco de olhos fechados. Não queria ir para a realidade tão rápido. Queria ficar no sonho, com minha mãe. Mas, uma hora ou outra, eu teria que levantar.
Deixei minha bolsa na cama e olhei em volta. Eu não estava em minha casa... Mas eu realmente não consigo ficar nervosa depois de ter chorado a noite toda. Eu ainda estava com sono, poxa! E nem tinha mais lágrimas para chorar. Aliás, o travesseiro rosa estava manchado de preto, por causa da maquiagem. Mas, enfim, vi um bilhete na cômoda ao lado da cama. Nele, estava escrito à mão:

Bem-vindo ao Colégio Interno Voras, caro aluno!
Seus pais, como sabe, colocaram-no no colégio, pois sabem de como somos capazes e os melhores...

O tio que escreveu isso deveria estar bêbado. Se meus pais me colocaram aqui, eles não são capazes e os melhores. E ele ainda escreveu Inferno errado.
Mas, fazer o quê, já que estava aqui, porque não aproveitar os benefícios?
O quarto até que parecia bem frufru. Devia ser colégio de Barbies e Kens. E, pelo jeito, cabiam duas Barbies naquele quarto. E, julgando pelo fato da Becca não estar aqui, aquele lugar deveria ser o pior do mundo. Onde ficava, aliás? E como conseguiram me trazer até aqui? Me doparam? Como assim?
Abri minha bolsa. Por sorte, eu tinha arrumado a bolsa pra balada a alguns dias, então minha maquiagem e espelho estavam lá.
Entrei no banheiro, onde o espelho era um pouco bem maior. O olho preto que eu tinha feito agora estava espalhado pelo rosto. Ah, merda... Murmurei. Lavei o rosto e refiz a maquiagem, aproveitando e olhando o que tinha dentro da minha bolsa.
Peguei meu mp3 e fiquei ouvindo música enquanto me arrumava. O banheiro era enorme, e fiquei lá um boooooom tempo, penteando o cabelo e ajeitando a maquiagem.

Hey, estou aqui a menos de uma semana, garota. Mas, a julgar pelo fato de meu pai te me colocado aqui, e Becca não ter nem sequer dado o ar da graça, deve ser um dos piores colégios dessa cidade, que aliás nem sei qual é. Minha voz agora estava um pouco mais doce, não sei porque. Mas, de qualquer jeito, ignorei. Fui até o guarda-roupa, pegando minha jaqueta de couro e jogando sobre os ombros. Estava frio hoje. Elle, nós temos uma terceira colega de quarto aqui. O nome dela é Afrodite Martin. Ela não está aqui agora, mas não se assuste quando ela chegar. E novamente voltei a arrumar minhas coisas. Não conseguia ficar parada quase nunca.
Coloquei minha bolsa sob a estante, ao lado de meu livro, que peguei e examinei. O nome escrito na capa era Oh, my Goth!, um dos meus livros favoritos. Se importa se eu colocar música? Perguntei, já colocando o CD no rádio. Continha algumas das minhas músicas originais, ou melhor, da minha banda, Sweet Nightmare.

You break my heart and make me cry, then you disappear, you fly, and leave me hurt again. But now I know your plans, and I'll don't search you, I'll forget you. Like clouds in the sky, I'll run for anywhere, and I'll be anyone. Cantava, enquanto arrumava minha bolsa. Agora já não havia mais bebida nela, nem nada do tipo. Merda. Isso era ruim, muito ruim. Ela é uma maldita Barbie falsa, igual a maioria dos filhos de ricos. E filhinha de papai, ainda por cima. Aposto que a família colocou no rádio, televisão, jornal, revista, cartas, outdoor, e todo tipo de coisa que chame atenção que a deusa do amor desapareceu. Revirei os olhos. Sério, eu odiava esse tipo de pessoa, sabe? Que finge ser o que não é. Eu sou Sarabeth seja em casa, seja na rua, seja nesse maldito colégio interno. Mas pessoas como meu pai, Becca, Afrodite e minha madrasta colocam uma máscara diferente a cada lugar que vão. Suas palavras são sempre gravadas nas mentes das pessoas e em papéis, e várias pessoas tentam copiar seu estilo. Mas um dia, nenhuma de suas máscaras funcionará de verdade, e então, os falsos perderão o lugar no mundo, que será tomado por novos falsos. Mas os que não tem hipocrisia custarão a decair.
Se eu fosse você, tomaria cuidado por aqui, Nem tudo é o que parece, eu sinto isso. Apenas tomando como base o fato de meu pai ter me colocado aqui.

Não conheço quase nada por aqui, mal saí do quarto nos últimos dias. Apenas hoje, que fiquei na frente do quarto. Procurei a caixinha de cigarros na minha bolsa, logo depois escondendo-a. Não era uma coisa permitida na escola, disso eu tinha certeza, e não gostava para fumar perto de crianças, tipo a garota de 13 anos. Em vez dos cigarros, peguei o livro de minha mãe, e as palavras novamente ressoaram em minha mente:


Estremeci na hora exata em que olhei para o livro. Quando seria a hora certa? O medo dominou minha mente, mas o afastei. As sombras em minha mente poderiam me dominar completamente, caso eu mergulhasse nela.
Me virei para a garota, Elle. Parecia ter medo do lugar. Elle, mesmo que seja um castigo, mesmo que nosso futuro seja horrível... Não se deixe ser levada pelo medo. Pelo menos, não completamente. Resista. Então meus olhos se perderam em um ponto qualquer do quarto. Como seria minha vida se eu tivesse desistido? Eu viveria em um porão, como realmente acontecia, mas ficaria lá, presa, sem poder sair. Sem Clarisse, sem banda, sem minha mãe. Sem refúgio. Eu seria... Vazia. Não se renda. Murmurei. Se eu tivesse me rendido, eu seria como Becca. Falsa, egoísta e hipócrita.
Acabei por voltar a cantar com a música, Don't forget. Don't forget to be strong, just stay here and never surrender, just don't forget who are you, or they will make you disappear. Fight, fight, fight for your life, fight for yourself. 'Cause no one will fight for you. 'Cause everyone will forget you. Beware with who are you, or they will break you and kill you. Beware, darling, beware. They wait in the shadow. They're watching you forever. Don't forget who are you. Don't forget who are you. Beware, beware, and wait for your turn. 'Cause now, you're dying and disappearing. But they will fall a day. Wait, wait, and don't forget to be who you are. Run, run, and don't forget who you love. Everyone will forget you, but you can't forget nobody. Don't forget, this is your life. This is your life. They will be more strong. Grow up, no one can save you now. Era tão estranho estar cantando minhas músicas em um quarto que nem é meu, como se fosse um show particular... Considerando-se a popularidade da minha banda, isso era impossível. Nossos shows aconteciam na praia todo fim de semana, e em todas as comemorações escolares, e até mesmo da cidade. Não havia quase ninguém naquela cidade que não gostasse se ouvir Sweet Nightmare. Mas fora dali, não éramos nada. E naquele lugar, eu me sentia estranha e deslocada, como em todos os lugares em que ninguém me conhecia. Quer dizer, sou a filha de um rico empresário, Sr. Darksunny, que traiu a mulher e teve uma filha com Jeanette Whisper! E ainda tenho uma banda, e para completar vivo criando escândalos na vida de meu pai. Por isso, estava acostumada a ser reconhecida, e não ignorada. Minha fama sempre foi algo oportuno para mim, considerando-se os benefícios. E Clarisse fazia tudo isso ainda melhor. Ela me leva para todas as festas, e sempre nos juntávamos à tarde para zoar as fotos de minha família. Não ter nada disso me deixava estranha e deslocada.
O sorriso sarcástico que normalmente ocupava minha face acabou por desaparecer. Por vezes, quando pensava em minha mãe, sentia como se o mundo de repente despencasse sobre meus ombros. Voltei a cantar. Don't forget, just don't forget. 'Cause your hope is your sanity. Don't forget how is horrible to be no one. 'Cause they will forget you if you forget this.